Ainda…
Sei a cor dos momentos a dois,
Das noites em preto e branco,
Que, sozinho, passei, depois.
Sei a cor do teu corpo eflúvio,
Que, em noites de amor, chovia,
Sobre mim… em dilúvio!
Sei a cor dos aromas que trazes,
Que me inebriam os sentidos,
Violentos, doces, vorazes…
Sei a cor de cada palavra vazia,
Sussurrada ao ouvido, na alma,
Hoje, consumida pela aleivosia.
Sei a cor da vitória perdida,
Que, no agitar da solidão
Procuro… pra ganhar vida.
Sei a cor dos sonhos em vão,
Do amor jurado em abraços,
Do real e da desilusão.
Sei a cor da dor que consome,
Do sangue que escorre e se engole,
E se bebe, e não mata a fome.
Até sei a cor das palavras improperadas,
Do silêncio gritado, frio, amordaçado,
Em ti, em mim, em duas bocas fechadas!
quinta-feira, 30 de abril de 2009
segunda-feira, 19 de janeiro de 2009
A essência da vida é saber fingir
“A essência da vida é saber fingir, ocultando o fingimento, quando se finge, fingindo que não se finge.” Carlos Colaço
20 anos após ter escrito esta reflexão e as palavras continuam a fazer todo o sentido. Não o mesmo sentido que lhes atribuí aos 17 anos, mas um sentido agregado. Nunca deixou de fazer sentido, como acontece com algumas que escrevi na mesma época. Pelo contrário, cada vez mais o seu significado se apura. Tem vindo a mudar ao longo dos anos, é claro, mas nunca se perdeu. Fingimos que somos, sem ser. Fingimos que não somos, quando sabemos piamente que somos. Fingimos que temos, quando o que temos se aperta na mão fechada… e não sobra nada. Fingimos que não temos, quando afinal, qual atlas, transportamos o mundo nas costas, em nós. E ainda pensamos que todo este fingimento não transparece, que os mais pequenos indícios não nos denunciam. Nós percebemos o fingimento no outro, mas ele nunca percebe o nosso. Temos sempre a certeza de ser melhor do que o outro, até no fingir. Sejamos sociais e façamos como o outro nos faz: fingimos não perceber o fingimento de quem finge…
20 anos após ter escrito esta reflexão e as palavras continuam a fazer todo o sentido. Não o mesmo sentido que lhes atribuí aos 17 anos, mas um sentido agregado. Nunca deixou de fazer sentido, como acontece com algumas que escrevi na mesma época. Pelo contrário, cada vez mais o seu significado se apura. Tem vindo a mudar ao longo dos anos, é claro, mas nunca se perdeu. Fingimos que somos, sem ser. Fingimos que não somos, quando sabemos piamente que somos. Fingimos que temos, quando o que temos se aperta na mão fechada… e não sobra nada. Fingimos que não temos, quando afinal, qual atlas, transportamos o mundo nas costas, em nós. E ainda pensamos que todo este fingimento não transparece, que os mais pequenos indícios não nos denunciam. Nós percebemos o fingimento no outro, mas ele nunca percebe o nosso. Temos sempre a certeza de ser melhor do que o outro, até no fingir. Sejamos sociais e façamos como o outro nos faz: fingimos não perceber o fingimento de quem finge…
Não sou eu, nem sou o outro
“Eu, não sou eu, nem sou o outro. Sou qualquer coisa de intermédio….” Mário de Sá Carneiro
Tenho dias em que me sinto eu. Tenho dias em que me sinto o outro. Tenho dias em que não me sinto nem eu, nem o outro, nem qualquer coisa de intermédio. Não sou a ponte, nem sou as margens. Deambulo nas águas do leito vazio, encontrando cada pedra, cada seixo, que se esconde, como se estivesse à minha espera. Procuro-me em cada gesto, em cada olhar e apenas fico ainda mais perdido, à deriva… Não me encontro, nem me espero. Sou todos e não sou alguém. Revisito os lugares em que já fui, em que sei que existi, mas também já lá não estou. Nem fora, nem dentro, nem perto, nem longe. Se sou, não me vejo, não me sinto, nem me encontro.
Tenho dias em que me sinto eu. Tenho dias em que me sinto o outro. Tenho dias em que não me sinto nem eu, nem o outro, nem qualquer coisa de intermédio. Não sou a ponte, nem sou as margens. Deambulo nas águas do leito vazio, encontrando cada pedra, cada seixo, que se esconde, como se estivesse à minha espera. Procuro-me em cada gesto, em cada olhar e apenas fico ainda mais perdido, à deriva… Não me encontro, nem me espero. Sou todos e não sou alguém. Revisito os lugares em que já fui, em que sei que existi, mas também já lá não estou. Nem fora, nem dentro, nem perto, nem longe. Se sou, não me vejo, não me sinto, nem me encontro.
As rosas e os espinhos
“Se, ao avistares uma roseira, apenas conseguires vislumbrar os espinhos, tenta erguer um pouco o olhar, as rosas costumam crescer mais acima.” Carlos Colaço
Existe em nós uma capacidade, algo ingrata, confesso, que é procurar ver, olhar, além do que vista alcança. Tentar sempre dissecar a aparência e chegar à essência. Contudo, isso dá trabalho e não se coaduna com o mundo do imediato e do fácil, com que nos deparamos todos os dias. É tão fácil não procurar, contentarmo-nos com o que está a descoberto, julgar e catalogar o produto. Não há tempo para a descoberta. Que venha o fast food e nos brinde com o seu contributo para o hedonismo, que tanto nos alimenta o corpo e que, ao mesmo tempo, nos deixa, cada vez mais, vazios, cheios de nada. E pagamos caro! Aloja-se em nós e, como parasita que é, consome-nos tudo o que pode: os sentimentos (para quem os tem), os princípios e valores (de quem os adquiriu) e a alma (se é que todos temos uma).
E quando as rosas são lindas? Temos tendência para nos esquecermos que, até as mais bonitas, são dotadas de espinhos, muitas vezes fortes, aguçados, contundentes. Vamos na ilusão da efemeridade duma beleza perene e fugaz, que apenas dura uns dias, acabando por murchar e apodrecer. Que prazer tão momentâneo! Em troca, exibimos as chagas que os espinhos nos infligiram, deixando cicatrizes… para sempre.
“Levo rosas entre os braços,
Espinhos no coração.
Entre beijos e abraços,
Os espinhos ficam… as rosas, vão.”
Existe em nós uma capacidade, algo ingrata, confesso, que é procurar ver, olhar, além do que vista alcança. Tentar sempre dissecar a aparência e chegar à essência. Contudo, isso dá trabalho e não se coaduna com o mundo do imediato e do fácil, com que nos deparamos todos os dias. É tão fácil não procurar, contentarmo-nos com o que está a descoberto, julgar e catalogar o produto. Não há tempo para a descoberta. Que venha o fast food e nos brinde com o seu contributo para o hedonismo, que tanto nos alimenta o corpo e que, ao mesmo tempo, nos deixa, cada vez mais, vazios, cheios de nada. E pagamos caro! Aloja-se em nós e, como parasita que é, consome-nos tudo o que pode: os sentimentos (para quem os tem), os princípios e valores (de quem os adquiriu) e a alma (se é que todos temos uma).
E quando as rosas são lindas? Temos tendência para nos esquecermos que, até as mais bonitas, são dotadas de espinhos, muitas vezes fortes, aguçados, contundentes. Vamos na ilusão da efemeridade duma beleza perene e fugaz, que apenas dura uns dias, acabando por murchar e apodrecer. Que prazer tão momentâneo! Em troca, exibimos as chagas que os espinhos nos infligiram, deixando cicatrizes… para sempre.
“Levo rosas entre os braços,
Espinhos no coração.
Entre beijos e abraços,
Os espinhos ficam… as rosas, vão.”
quarta-feira, 23 de abril de 2008
"As marcas que uma enchente gravou nas margens do rio só serão apagadas por uma enchente ainda maior." Carlos Colaço
O pior é quando contruímos barragens, ou desvios no curso da água, a montante dessas marcas, não permitindo que a água cubra o leito. Não permitimos, voluntária ou involutariamente, que a água passe e nova enchente se forme. Preferimos manter o leito vazio, expondo as cicatrizes da enchente anterior, e perdemos o precioso tempo a admirá-las, e muitas vezes a exibi-las, como se um troféu se tratasse. até um dia em que acordamos e sentimos que essas marcas deixaram de fazer sentido, que a memória já se esvaziou de tudo aquilo que a enchente arrastou e nos trouxe... aí, muitas vezes procuramos destruir a barragem, abrir as comportas de par em par... e surpreendemo-nos, porque a água, de tanto estar retida, infiltrou-se, evaporou-se e a pouca que restou está putrefacta e nos vais infestar o leito que, teimosamente, deixamos vazio. Perda de tempo. Vamos ter que deixar a chuvar cair, lavar as pedras, as areias, purificar o leito, para, então, podermos receber nova enchente e aproveitar os tesouros que vêm dar à margem. Pode deixar marcas, ou não, depende do tempo que a enchente durar, mas, com certeza, irá apagar as anteriores, libertar-nos-á!
O pior é quando contruímos barragens, ou desvios no curso da água, a montante dessas marcas, não permitindo que a água cubra o leito. Não permitimos, voluntária ou involutariamente, que a água passe e nova enchente se forme. Preferimos manter o leito vazio, expondo as cicatrizes da enchente anterior, e perdemos o precioso tempo a admirá-las, e muitas vezes a exibi-las, como se um troféu se tratasse. até um dia em que acordamos e sentimos que essas marcas deixaram de fazer sentido, que a memória já se esvaziou de tudo aquilo que a enchente arrastou e nos trouxe... aí, muitas vezes procuramos destruir a barragem, abrir as comportas de par em par... e surpreendemo-nos, porque a água, de tanto estar retida, infiltrou-se, evaporou-se e a pouca que restou está putrefacta e nos vais infestar o leito que, teimosamente, deixamos vazio. Perda de tempo. Vamos ter que deixar a chuvar cair, lavar as pedras, as areias, purificar o leito, para, então, podermos receber nova enchente e aproveitar os tesouros que vêm dar à margem. Pode deixar marcas, ou não, depende do tempo que a enchente durar, mas, com certeza, irá apagar as anteriores, libertar-nos-á!
quarta-feira, 16 de abril de 2008
Hoje respirei fundo. Renasci em cada suspiro, apesar de estar consciente que cada inspiração me aproxima do fim (como é possível que algo que nos aproxima do fim nos faça sentir renovados, às vezes?). Tive plena consciência do processo. Sentia os pulmões encher, e esvaziar, conseguia mesmo ver o tecido esponjoso, e preto, a inflamar-se e a voltar ao estado de repouso. Senti que tinha pleno controlo sobre o meu sistema nervoso autónomo. Inconsciências que nos fazem sentir mais fortes. Estratégias do nosso inconsciente que nos permitem evitar sentimentos de impotência e nos ajudam a lidar com as frustrações do dia-a-dia. Não importa o porquê, importa que dominava algo, pelo menos o que se passa dentro de mim, ainda que tenha plena consciência de que esta é uma sensação ilusória. Árroto o ar que me sufoca e me faz sentir o latejar corpóreo desta vã existência, presentindo que deixarei de me sentir, de me auto-controlar, ao deixar fugir esta bolha que me prendia a mim, que me tornava consciente dos batimentos, em vão, emitidos pela casa das máquinas, que tantas vezes passa despercebida e ignorada. Finalmente o dia chegou ao fim. Vou poder parar, pensar e preparar-me para um amanhecer cinzento, frio e vazio. Mas que importa isso? Vale sempre a pena esse amanhecer, porque se o de amanhã for cinzento, outros mais coloridos virão... basta ter paciência e seguir amanhecendo, até ao fim, até aos dias de sol, de côr e de plenitude.
segunda-feira, 14 de abril de 2008
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